
Somente um autor defunto — isto é, liberto das convenções sociais, imune às críticas da imprensa, já sem dívidas, sem contas a prestar ao mundo nem ao espelho — pode ser plenamente honesto. Um vivo hesita, mede palavras, alisa reputações. Um morto, porém, escreve com a tranquilidade de quem já não precisa ser perdoado, aplaudido ou sequer lido.
Essa é a premissa de Memórias Póstumas de Brás Cubas, obra em que Machado de Assis comete a ousadia de dar voz a um cadáver. Um cadáver articulado, reflexivo, perspicaz, cínico e sincero.
Ao longo do livro, Brás Cubas revela o que todos suspeitam, mas poucos admitem: que a narrativa é um artifício, uma corda bamba estendida entre o real e o desejado, entre a lembrança e a invenção. Um pêndulo que oscila entre a verdade que se insinua e a mentira que se assume com elegância.
Anuncio que este é provavelmente o primeiro de vários episódios que farei sobre a obra. E sim, apareço com meus bigodes.