Neste episódio conversamos com Philippe Claude Thierry Lacour sobre o conhecimento clínico nas ciências humanas. Percorremos importantes reflexões epistemológicas para compreender a emergência da clínica nas ciências sociais.
Entrevistadoras: Thamires Castelar e Carolina Lima.
Referências citadas na entrevista:
LACOUR Philippe, « Le statut épistémologique de la connaissance clinique : abduction, transduction ou casuistique ? », in LACOUR Philippe, RABACHOU Julien, LEFEBVRE Anne, Approches de l’individuel. Epistémologie. Logique. Métaphysique, Paris, PENS,2017.
LACOUR Philippe, La raison au singulier. Réflexions sur l’épistémologie de Jean-Claude Passeron, Paris, Presses Universitaires de Paris Nanterre, 2020.
Lacour Philippe (2012), La nostalgie de l’individuel. Essai sur le rationalisme pratique de Gilles-Gaston Granger, Paris, Vrin, collection « Mathèsis » (juin), 220 p.
Neste episódio recebemos a pesquisadora Carolina Vicente Ferreira Lima para conversar sobre desigualdade social no Brasil a partir de sua pesquisa de doutoramento, na qual trabalha com trajetórias de vida de empresários da construção civil em Brasília-DF, utilizando a abordagem teórico-metodológica da Sociologia Clínica.
Entrevistadores: Pedro Henrique Isaac Silva e Thamires Castelar Torres Salles.
Desigualdade social é um tema importante que marca as sociedades contemporâneas e suscita debates acalorados. Talvez possamos afirmar, com alguma margem de segurança, que se trata de uma das principais questões com as quais sociedades de economia capitalista foram e são obrigadas a se confrontar. A noção moderna de igualitarismo, baseada na teoria política e na filosofia moral, parte da ideia de que grande parte das desigualdades nas condições de vida das pessoas é um produto social criado a partir de injustiças. Nesta perspectiva, a maior parte dos ricos e dos pobres existiria como resultado de injustiças prévias. A obra Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade de Jean-Jacques Rousseau, datada de 1754, inaugura o debate. Nela, Rousseau enfatiza a importância da igualdade de direitos políticos e, em menor proporção, de algum grau de igualdade de condições de vida. Estas ideias estão na base do pensamento que irá influenciar muitos autores posteriormente, principalmente economistas políticos e sociólogos. Já no século XX, o livro Uma Teoria de Justiça do estadunidense John Rawls, vem reforçar a noção de justiça enquanto promoção de equidade. Temos, portanto, uma discussão que não escapa de sua base normativa e que evidencia um conflito distributivo presente nas sociedades ocidentais. No Brasil, sabemos que a desigualdade socioeconômica é um dos aspectos mais evidentes. Por aqui tivemos uma história marcada por colonização, escravismo, dependência em relação às nações mais ricas, regimes autoritários e dificuldade de adoção literal de princípios republicanos e democráticos. Ademais, tivemos também um inconcluso Estado de Bem-estar social. A tradição sociológica se debruçou longamente na investigação a respeito das formas de vida de um dos polos desse conflito: a pobreza. Mas o que temos a dizer sobre o outro polo? O da riqueza. E mais, como se sustenta a persistente desigualdade social que vemos no Brasil? Ao passo em que as políticas para o desenvolvimento econômico protagonizam o projeto de modernização do Brasil, as grandes empreiteiras, principais promotoras de urbanização e de integração nacional, tornam-se importantes aliadas do Estado. Em grande medida, a história coletiva brasileira, marcada pela reprodução das desigualdades, está inegavelmente atrelada à história de uma elite e manutenção de seus privilégios. As grandes obras significaram o enriquecimento de empresas no ramo da engenharia e da construção civil. É precisamente para enxergar esse lado do processo que nossa entrevistada hoje ajusta suas lentes e se debruça sobre trajetórias de vida dos ricos.
Referências citadas na entrevista:
http://www.ihu.unisinos.br/604486-uma-gramatica-de-privilegios-revelada-na-historia-das-empreiteiras-entrevista-especial-com-carolina-lima
NUNES, C.; PENSO, M. e SILVA, P. Diálogos em Sociologia Clínica. Dilemas Contemporâneos. Editora IFB, Brasília, 2018.
LIMA, Carolina. A riqueza e suas diferentes formas de apropriação: Hierarquias sociais no Brasil contemporâneo. Um olhar da sociologia clínica sobre a trajetória de vida de empreiteiros na cidade de Brasília-DF. Tese de doutorado, Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade de Brasília, 2020.
Neste episódio entrevistamos duas especialistas em Sociologia Clínica, a socióloga Christiane Girard e a psicossocióloga Teresa Carreteiro. Elas discorrem sobre essa abordagem e suas origens.
Entrevistadores: Carolina Lima e Natalino Souza
Sociologia clínica. As duas palavras que compõem esse termo nos fazem pensar.
Sabemos que a sociologia é uma disciplina que se desenvolve a partir de mudanças desencadeadas e vivenciadas em período que a historiografia convencionou chamar de moderno. Fenômenos como a racionalização e a secularização do tecido social, a ascensão do capitalismo como modo de organizar a produção material e as relações de produção, os processos de industrialização e urbanização das sociedades europeias, os processos migratórios para as Américas e a emergência da “questão social” com as revoluções de 1848 na França, são alguns dos elementos que ajudam a situar a formação e estabelecimento da disciplina no campo científico contemporâneo.
Desde Auguste Comte, com seu curso de filosofia positiva, passando pelas diversas vertentes do marxismo, da sociologia compreensiva, do estrutural-funcionalismo, do interacionismo-simbólico, até às teorias da prática e tantas outras, a sociologia busca interpretar a estrutura e a mudança social, assim como a interação dos indivíduos com tais instâncias, com as diversas formas de organização social e entre si.
A etimologia da palavra clínica, por sua vez, nos informa sua origem na língua grega antiga. Klinikos significa “leito, cama, aquilo sobre o qual se deita”. A prática da clínica, mais comumente relacionada entre nós à atividade médica, ao acompanhamento junto ao leito de pacientes de seu padecimento e a busca pela cura para sua doença e sofrimento, na contemporaneidade extrapola os consultórios médicos, encontra a psicologia, a psicanálise e, finalmente, a sociologia. Mas o que esse encontro significa?